4 de agosto de 2011

O DESPREZO PELAS MERENDEIRAS

ALEXANDRE BRASIL FONSECA
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Os conhecimentos reunidos pelo campo da educação já são mais do que suficientes para atestar o quanto amplo e inclusivo é o processo educativo. A escola tem sido entendida como um espaço sociocultural, numa situação em que homens, mulheres e crianças se "educam entre si", trocam experiências e conteúdos que vão muito além do espaço da sala de aula.
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Em relação à alimentação, esta compreensão tomou escopo de lei ao se afirmar a importância da promoção de uma alimentação saudável e adequada nas escolas (Lei 1.010/2006) e ao definir novos parâmetros relacionados à aquisição, à abrangência e ao papel educativo da alimentação escolar (Lei 1.1947/2009).
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O Programa Nacional de Alimentação Escolar é uma das mais antigas e amplas políticas públicas em vigência no país, e as recentes alterações no programa representam importantes avanços, sendo uma referência internacional. Sua abrangência foi ampliada com a inclusão do ensino médio, reafirmando-se a alimentação escolar como um direito dos alunos.
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A lei de 2009 exige que os governos municipais e estaduais utilizem, pelo menos, 30% dos recursos repassados pelo governo federal na compra de gêneros alimentícios diretamente da agricultura familiar. Essa decisão possui significativa importância, pois representa um importante estímulo para a economia, como também a possibilidade concreta de um menor consumo de alimentos industrializados graças à aquisição desses produtos in natura, os quais também ampliam a possibilidade de termos uma maior presença da cultura alimentar local.
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O espaço da alimentação escolar representa uma rica oportunidade de exercício da tão desejada interdisciplinaridade, sendo também central para a educação em saúde. Nesta tarefa a comunidade escolar pode e deve ser acionada na promoção de inovadores processos educativos relacionados à alimentação, os quais precisam ir além da atuação dos profissionais de educação, incluindo os de saúde e os da assistência.
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Nesse sentido, considera-se lamentável a afirmação neste O GLOBO do subsecretário estadual de Gestão de Ensino, sr. Antonio Neto, segundo o qual é mais adequado que as merendeiras sejam terceirizadas, pois "não precisam ter uma base pedagógica", já que para ele "uma merendeira só precisa manusear os alimentos".
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Historicamente tem sido atribuída às merendeiras uma posição socialmente inferior. As pessoas que exercem essa função são, em sua maioria, mulheres, negras, com baixa escolaridade e são vistas como semidomésticas. Para piorar, sua remuneração é baixa, menos do que a metade do que é pago aos funcionários terceirizados pelo governo estadual do Rio de Janeiro para exercer a mesma função.
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As possibilidades de contribuição das merendeiras nos processos de ensino e aprendizagem são enormes. É fundamental que gestores e professores tenham em mente esta compreensão e que promovam ações e oportunidades para tal inserção em torno da multidimensionalidade da alimentação. Práticas que vão muito além do preparo e da distribuição dos alimentos e que incluem atenção, afeto, cuidado e conhecimento variados - oriundos tanto de saberes populares como científicos.
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Também é fundamental que seja assumida a importância das merendeiras, com o desenvolvimento de uma carreira pública e de processos formativos em que as mesmas sejam incluídas, numa perspectiva de que sua formação vá além de aspectos higiênicos e sanitários, incluindo condições de trabalho, melhores salários e diálogo dessas chefs escolares com especialistas do campo da gastronomia, tornando os momentos de alimentação na escola espaço de mais prazer e de novas aprendizagens. Ações educativas desenvolvidas nas escolas em torno da alimentação precisam incluir a contribuição das merendeiras, as quais possuem uma relação direta com os alunos, e a possibilidade de partilhar novos e importantes conhecimentos com a comunidade escolar.
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ALEXANDRE BRASIL FONSECA é professor da UFRJ e coordena a pesquisa "Mapeamento e delimitação da alimentação escolar no Brasil", do Observatório da Educação/Capes-Inep.
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Artigo publicado em 1/8/2011 no jornal O GLOBO

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