Marcos Cassin
Professor da Universidade de São Paulo
Militante da Base Caio Prado Jr/Ribeirão Preto
1 - Aspectos da construção histórica da concepção marxista-leninista de partido político revolucionário.
Marx e Engels formularam uma proposta
para a organização do Partido Comunista no final de 1847, a pedido da
Liga dos Comunistas, uma associação operária internacional, sendo o
Manifesto do Partido Comunista publicado pela primeira vez em Fevereiro
de 1848.
O manifesto aparece numa década em que a
produção industrial atingia cifras elevadíssimas, difusão das ciências
jamais vista, publicações de livros na casa de centenas de milhares, a
ferrovia no Reino Unido em 1845 transportou 48 milhões de passageiros,
em 1846 já havia três mil milhas de via férrea e nos E.U.A., chegava a
nove mil milhas em 1850.
Por outro lado, aumentava o número de
operários e sua resistência à exploração burguesa cada vez mais brutal.
No campo, as revoltas de semi-servos e camponeses alastram-se por toda a
Europa.
Neste contexto aparece o Manifesto do
Partido Comunista que propunha a criação de um partido operário que
tinha como primeira tarefa organizar o operariado como classe, com o
objetivo claro de acabar com o domínio da burguesia e a construção de um
poder político operário.
No manifesto é feita uma exposição
sistemática de uma concepção de história, do capitalismo e da revolução.
Nele é afirmado que a história de todas as sociedades que existiram,
até nossos dias, tem sido a história das lutas de classe e que estas
lutas sempre terminaram por uma transformação revolucionária da
sociedade inteira ou na destruição das classes em luta. Essas afirmações
expressam a visão de Marx e Engels do dinamismo da sociedade através da
luta de classes. Luta que moveu as sociedades em toda a sua história e
que levará à construção de uma nova sociedade.
Esta luta, no capitalismo, se dá entre a
burguesia, proprietária dos meios de produção, e a classe que se
antagoniza aos seus interesses, o proletariado que, desprovido dos meios
de produção, é obrigado a vender sua força de trabalho à burguesia.
Esta contradição está na essência das relações capitalistas de produção e
determina a luta política: a burguesia, enquanto classe dominante em
luta permanente para a conservação da sociedade capitalista e o
operariado, em luta pela transformação social e superação destas
relações.
A transformação social na sociedade
capitalista, segundo os princípios do marxismo, só é possível através da
direção da classe operária, única capaz de cumprir esta tarefa através
da revolução socialista. A direção exercida pela classe operária no
processo revolucionário é construída a partir do momento em que o
operariado toma consciência de classe e percebe que seus interesses são
antagônicos aos da burguesia, que até então contava com o apoio da
classe operária contra a aristocracia.
Os primeiros elementos para que a classe
operária tome consciência de seus próprios interesses enquanto classe,
contraditoriamente, são fornecidos pela própria burguesia.
Escrevem Marx e Engels no "Manifesto do Partido Comunista":
Em geral, os choques
que ocorrem na velha sociedade, favorecem de diversos modos o
desenvolvimento do proletariado. A burguesia vive em guerra perpétua
primeiro contra a aristocracia, depois, contra as frações da própria
burguesia, cujos interesses se encontram em conflitos com os processos
da indústria; e sempre contra a burguesia dos países estrangeiros. Em
todas essas lutas, vê-se forçada a apelar para o proletariado, reclamar
seu concurso e arrasta-lo assim para o movimento político, de modo que a
burguesia fornece aos proletariados os elementos de sua própria
educação política, isto é, armas contra ela própria.
Demais, como já vimos, frações inteiras
da classe dominante em conseqüência do desenvolvimento da indústria, são
precipitadas no proletariado, ou ameaçadas, pelo menos, em suas
condições de existência. Também elas trazem ao proletariado numerosos
elementos de educação.
A educação política revolucionária da
classe operária é um dos elementos para a tomada de consciência de
classe e de que seus interesses são opostos ao da burguesia, que sua
emancipação só será possível com a destruição da sociedade capitalista e
a construção do socialismo através da revolução. Mas como organizar a
classe operária do ponto de vista político? Como superar as
reivindicações restritas às condições de trabalho e melhores salários?
Como o operariado deve agir taticamente para alcançar seus objetivos
estratégicos?
O Manifesto do Partido Comunista é a
tentativa de Marx e Engels de responder a estas questões que já se
apresentavam na metade do século XIX.
O ano da primeira publicação do
Manifesto do Partido Comunista, 1848, foi o ano das grandes revoluções
do século passado, destacando-se a parisiense que significou a primeira
grande batalha entre o proletariado e a burguesia. A derrota do
proletariado remeteu, por determinado período, ao plano secundário as
reivindicações sociais e políticas da classe operária europeia. Os
poucos movimentos que deram sinal de vida foram esmagados sem piedade.
Somente na década de 60 do século XIX, a
classe operária europeia recuperou forças para se contrapor às classes
dominantes. Esta nova situação impõe a necessidade de uma organização
que aglutinasse todas as forças do proletariado. Nasce a Associação
Internacional dos Trabalhadores em Londres no dia 28 de Setembro de
1864, com a aprovação do Manifesto Constituinte e Regulamentos
Provisórios da Associação Internacional dos Trabalhadores, redigida por
Marx.
Este manifesto e estatutos provisórios
serviram de base para a elaboração dos Estatutos da Associação
Internacional dos trabalhadores, também redigido por Marx, e aprovado em
Setembro de 1871 na Conferência da Associação realizada em Londres.
Nos Estatutos de 1871, Marx escreveu a
respeito da necessidade do Partido Político para que a classe operária
atingisse seus objetivos, a revolução e a construção da sociedade
socialista.
Em sua luta contra o
poder coletivo das classes possuidoras, o proletariado só pode atuar
como classe constituindo-se em um partido político distinto, em oposição
a todos os velhos partidos constituídos pelas classes possuidoras.
Essa constituição do proletariado em
partido político é indispensável para assegurar o triunfo da revolução
social e desse objetivo supremo: a abolição das classes.
As ideias de Marx, Engels como as de
Lênin, são os pilares teóricos no qual se sustentam os Partido
Comunistas, sendo o último quem melhor deixou sistematizado o problema
do Partido Político da classe operária. Como se devem organizar, quais
seus objetivos táticos e estratégicos como se deve conduzir nas alianças
políticas e no seu papel conscientizador da classe operária e das
massas, ou seja, seu papel educador.
Vladimir Ilitch Ulianov, Lênin, iniciou
sua atividade política em 1887, aos dezessete anos, num período de
grande combate político na esquerda russa entre os marxistas russos,
liderados por Plekanov, e os populistas, ainda dominante. Neste período,
Lênin esteve fortemente influenciado pela ideologia populista, só no
ano seguinte que iniciou seu estudo do marxismo.
Em 1893, formou-se em Direito e mudou-se
para S. Petersburgo para trabalhar. Logo ao chegar à Capital, da época,
entrou em contato com os círculos revolucionários e de início, começou a
esboçar as linhas estruturais de uma organização revolucionária. Neste
mesmo ano, reorganizou seu círculo depois de assumir a direção. Criou um
grupo central com a tarefa de dirigir centralizadamente a atividade
geral, organizar reuniões e conferências e formar grupos de discussão de
operários que se tornavam instrutores e formadores de novos grupos.
Estes dados indicam sua preocupação com a
formação dos quadros e militantes, e sua organização, que já estavam
presentes desde o início de sua atividade política.
Em 1895, foi organizada a União de Luta
pela Emancipação da Classe Operária, organização política que uniu todos
os círculos marxistas de S. Petersburgo, sob sua direção. A importância
desta organização está em que pela primeira vez na Rússia, uma
organização política unia as ideias do socialismo científico com o
movimento operário. Neste mesmo ano, Lênin é preso, acusado de "crime
contra o Estado".
O ano seguinte, 1896, foi marcado pelas
grandes greves em S.Petersburgo, que depois se prolongaram a Moscou.
Estas greves marcaram o início do movimento operário de massas na
Rússia, com a participação da social-democracia na Rússia. Da prisão,
Lênin dirigiu os sociais-democratas neste importante movimento histórico
do operariado russo e internacional.
Em 1897, foi deportado para a Sibéria.
No ano seguinte, casou-se com Nadejda Krupskaia que também havia sido
deportada em 1898. Foi no exílio que teve notícias do I Congresso do
Partido Operário Social-Democrata Russo, POSDR, realizado na cidade de
Minsk em Março de 1898, e solidarizou-se com as teses fundamentais do
manifesto publicado pelo Congresso. No ano de 1900, retornou do exílio
com a convicção da necessidade de um jornal para unificar os diversos
núcleos revolucionários que continuavam na mesma situação, mesmo depois
do Congresso de fundação do POSDR.
Junto com Martov, Potressou e o grupo de
Plekhanov constituíram o coração do jornal. O primeiro número do Iskra
(A Faísca) saiu no dia 24 de Dezembro de 1900.
O Iskra foi a concretização do sonhado
instrumento de unificação ideológica e de assentamento das bases
programáticas essenciais à construção do partido.
O jornal passou a ser um eficiente
instrumento de divulgação de seus artigos, principalmente os de
organização e da linha política que o partido deveria ter. Além dos
vários artigos a respeito da questão, Lênin sistematizou de forma mais
acabada sua compreensão da estrutura partidária, em três brochuras: "Que
Fazer?", 1901/1902, "Um passo em frente, dois passos atrás", 1904 e
"Duas táticas da social-democracia na revolução democrática", 1905.
O livro "Que Fazer?" teve um esquema
original que se consistia em três questões: carácter e conteúdo
principal da agitação política; tarefas de organização; e plano de um
jornal para toda a Rússia que servisse de base à formação da
organização. Este plano inicial teve que ser mudado para responder às
necessidades que a luta contra o economismo impunha. O resultado foi a
introdução de dois capítulos iniciais destinados a combater o
oportunismo em geral, e especialmente ao economismo russo. Quanto às
questões do plano inicial, passou a ter um aspecto de polêmica
anti-economista. Na obra "Um passo em frente, dois passos atrás", fez
uma descrição do II Congresso do POSDR, onde esclarece as posições das
frações, bolchevique e menchevique, e dos grupos minoritários e avança
nas suas concepções do que devem ser os princípios organizativos de um
partido proletário, contrapondo-se à política organizativa defendida
pelos mencheviques que defendiam uma organização de círculos
coordenados. Esta obra ajudou a formar a primeira organização da fração
bolchevique do POSDR, em torno de Lênin.
Quanto ao livro "Duas táticas da
social-democracia na revolução democrática", Lênin considera que
existiam três posições à situação da Rússia agitada pelas inúmeras
greves de 1905: a primeira, de que a Rússia passava por um momento que
possibilitava reformas do tipo democráticas, posição defendida pela
burguesia liberal: a segunda, defendida pelos reformistas, considerava o
momento uma fase da revolução democrática-burguesa, sendo que a
burguesia liberal deveria dirigi-la; a terceira, era a revolucionária,
que aceitava que a fase era democrática, mas que para ser útil ao
proletariado, teria que conseguir conquistas
democrático-revolucionárias, que colocassem a situação favorável de
evoluir para o socialismo. Para isto, era necessário isolar a burguesia
liberal e aliar-se com o campesinato e alguns setores da pequena
burguesia urbana, pois estes tinham interesses de levar as
transformações o mais longe possível.
Este breve histórico teve como objetivo
apresentar aspectos da concepção marxista-leninista de Partido Político,
e conceitos referentes a este, foram construídos historicamente. Sendo
estas três últimas obras citadas a consolidação da concepção
marxista-leninista de Partido Político. Isto não significa que não houve
outros escritos após 1905, e escritos importantes, mas que sua
estrutura conceitual estava dada.
2 - O papel do Partido Político como agente educador
Neste item apresentamos a importância
das questões pertinentes ao papel educativo do partido em vários
escritos de Lênin, sem a preocupação cronológica, mas com a intenção da
fidelidade terminológica, e deste como síntese do acumulo teórico com a
prática do militante político. Em seus escritos, ele debate com seus
contemporâneos sobre a organização do partido revolucionário, a elevação
da consciência do proletariado trade-unionista a uma consciência
política de classe, a atuação deste partido frente aos outros partidos,
os sindicatos, parlamento e, à sociedade em geral.
No livro "Que Fazer?", Lenin defende que
a luta pelo socialismo só pode ser travada a partir de uma consciência
socialista, ou seja, consciência política de classe que só pode ser
incorpora pelo operariado quando vem do exterior desta classe, "fora da
esfera das relações restritas entre operários e patrões", uma vez que a
luta espontânea limita as questões que envolvem o operariado e seus
patrões. O conhecimento que pode fazer com que o operariado eleve sua
consciência ao nível socialista, é o conhecimento obtido é produzido a
partir das relações entre todas as classes e camadas com o Estado e o
governo e nas relações de todas as classes entre si.
Esta análise o leva a afirmar que, ao
sair da luta entre operário e patrão que se limita às questões
relacionadas com melhorias das condições de trabalho e salários e
incorporando a luta das várias classes em relação ao Estado, com o
propósito de dirigi-las para a conquista do poder de Estado, o
operariado toma consciência socialista, saindo do limite de operário e
elevando-se à condição de revolucionário.
Mas, para alcançar a condição de
revolucionário, impõe-se a necessidade do estudo teórico, o estudo da
ciência socialista que é elaborada fora das relações restritas do
operariado com o patrão. Isto não significa que a classe operária é
incapaz de formar seus próprios intelectuais, elaboradores de teoria.
Lênin escreveu a respeito em uma nota de rodapé do livro "Que fazer?":
Isto não significa,
naturalmente, que os operários não participem nessa elaboração. Mas não
participam como operários, participam como teóricos do socialismo, como
os Proudhon e os Weitling; noutros termos, só participam no momento e na
medida em que consigam dominar, em maior ou menor grau, a ciência da
sua época e fazê-la progredir. E para que os operários os consigam com
maior freqüência é preciso esforçar-se o mais possível para elevar o
nível de consciência dos operários em geral; é preciso que os operários
não se confinem ao quadro artificialmente restrito da 'literatura para
operários', mas aprendam a assimilar cada vez mais a literatura geral.
Seria mesmo mais justo dizer, em vez de 'não se confinem', 'não sejam
confinados', por que os próprios operários lêem e querem ler tudo quanto
se escreve também para os intelectuais e 'só alguns (maus) intelectuais
pensam que 'para os operários' basta falar das condições nas fábricas e
repisar aquilo que já sabem há muito tempo.
Todo este processo de elevação da
consciência política, intelectualização e organização da classe operária
passa, necessariamente, pela organização do partido da classe operária,
que terá êxito com um eficiente trabalho educativo interno e externo ao
partido e à classe operária.
O papel educativo do Partido Comunista é
educar a militância e as massas para a luta e construção do socialismo.
Portanto, a educação dos comunistas e das massas trabalhadoras é um
importante instrumento da luta política que, para a classe operária,
significa a tomada do poder de Estado e a construção do socialismo,
objetivos esses que só serão alcançados através das organizações e ações
revolucionárias do proletariado fundamentadas pela teoria
revolucionária:
"Sem teoria revolucionária não pode haver também movimento revolucionário".
Ainda no livro "Que fazer?", Lênin cita
Engels, identificando a importância da teoria e dizendo que este é outro
campo de luta de classes em que os revolucionários devem se preparar:
Citaremos as
observações feitas por Engels em 1874 sobre a importância que a teoria
tem no movimento social-democrata. Engels reconhece na grande luta da
social-democracia não duas formas (a política e a econômica) - como se
faz entre nós - mas três, colocando a seu lado a luta teórica.
A necessidade de assimilação da teoria
revolucionária por parte da classe operária aponta a questão: quais
devem ser as condições que possibilitem instrumentalizar os
revolucionários de uma teoria revolucionária?
A resposta a essa questão, do ponto de
vista marxista-leninista, é que o instrumento que possibilita a
assimilação da teoria revolucionária pelos revolucionários é o partido
da classe operária (Partido Comunista), que deve utilizar como princípio
educativo a relação teoria/prática. O partido tem que propiciar uma
educação que articule a teoria e a vida cotidiana, para que o partido
não limite seu programa de formação às experiências cotidianas da vida e
nem aos estudos teóricos desvinculados da realidade concreta. Estas
preocupações foram manifestadas por Lênin em seu artigo "Sobre a
confusão da política e a pedagogia", escrito em 1905:
Na atividade
política do partido social-democrata há e haverá sempre certos elementos
de pedagogia: é preciso educar toda a classe dos trabalhadores
assalariados a fim de que desempenhem o papel de combatentes para
libertar toda a humanidade de qualquer opressão; é preciso educar
constantemente novas e novas camadas desta classe, saber aproximar-se
dos elementos mais atrasados, menos desenvolvidos , menos influenciados
por nossa ciência e pela ciência da vida, para poder falar e estabelecer
contato com eles e elevá-los paciente e firmemente ao nível da
consciência social-democrata sem converter nossa doutrina em um dogma
sem vida, ensinando-a não apenas com livros, mas também por meio da
participação das camadas mais atrasadas, e menos desenvolvidas do
proletariado na luta diária e prática.
A preocupação da relação teoria/prática
na formação dos revolucionários também é trabalhada por ele, ao
referir-se às experiências do movimento revolucionário nos grandes
acontecimentos e como essas experiências possibilitaram um avanço na
qualidade do movimento e, para fundamentar esta tese, exemplificou,
através de análises das greves da metade do século XIX e de como
contribuíram para o crescimento do movimento operário que se manifestou
nas greves dos anos 90 do mesmo século e como estas foram embriões da
luta consciente do proletariado contra a burguesia.
Ele também chama a atenção para a
necessidade de se aprender na observação da vida cotidiana das massas
operárias e camponesas. Os ensinamentos que os grandes movimentos da
história e da vida cotidiana oferecem para a educação da classe operária
e das massas não são suficientes para formá-las politicamente,
necessitando, para tanto, um ensino teórico e sistemático da ciência
revolucionária, o socialismo científico. Este estudo tem a maior ou
menor importância, segundo as condições revolucionárias, ou seja, se há
movimentos de grande agitação e/ou revolucionários, o estudo sistemático
fica secundarizado, sendo que o processo de formação da classe operária
e das massas se dá na própria luta; se o movimento operário passa por
período de calmaria, de repressão por parte das forças reacionárias, o
estudo sistemático tem que ser priorizado na luta do proletariado. É
nesses momentos que a luta ideológica toma maior importância e a classe
operária tem que se organizar e se preparar para esta dura batalha
contra a burguesia e no seu próprio interior, uma vez que esses momentos
favorecem as vacilações e tendências pequeno-burguesas no seio da
classe operária.
Este é um movimento que não pode ser
entendido de forma mecânica. Dar prioridade aos movimentos de rua e
extrair, a partir daí, lições que servirão para a formação dos
militantes e das massas, não exclui a importância do estudo sistemático.
É este que possibilita uma qualidade diferente das ações de agitação e
revolucionárias. O inverso também é verdadeiro, quando se priorizam os
estudos sistemáticos em consequência do momento histórico que se vive,
não se abandona o movimento de rua, pois é este que concretiza as
possibilidades de transformações guiadas por uma teoria.
Lenin em seu artigo "Novas tarefas e
novas forças", escrito no início da revolução de 1905, indica quais
devem ser as tarefas da social-democracia e quais as prioritárias do
movimento frente ao momento revolucionário:
... é preciso ampliar em grande medida
todo tipo de organizações do Partido ou a ele afetas para ir, ainda que
seja em certo grau, ao compasso da torrente centuplicada da energia
revolucionária popular. Isto não significa, está claro, que se deva
abandonar a firme preparação e a educação sistemática nas verdades do
marxismo; mas é preciso ter em conta que agora, na preparação e na
educação, assumem muito mais importância as próprias ações militares,
que ensinam os não iniciados a seguirem nossa orientação e nenhuma outra
mais. É preciso ter presente que nossa fidelidade 'doutrinária' ao
marxismo se reafirma neste momento em virtude de o curso dos
acontecimentos revolucionários dar, em toda parte, lições concretas às
massas, e todas estas lições confirmam precisamente nosso dogma...
Não se trata,
portanto, de enfraquecer nossas exigências social-democratas e nossa
intransigência ortodoxa, mas de reforçá-las por novos caminhos, com
novos métodos de ensino. Em tempos de guerra é preciso instruir os
recrutas diretamente nas ações militares. Assimilai, pois, com mais
audácia, os novos métodos de instrução, camaradas! Formai com mais
audácia, novos e novos destacamentos, enviai-os ao combate, recrutai
mais jovens operários, ampliai os limites habituais de todas as
organizações do Partido, começando pelos comitês e terminando pelos
grupos de fábricas, sindicatos de oficina e círculos estudantis!
Recordai que toda demora de nossa parte na realização desta tarefa
beneficiará os inimigos da social-democracia, pois os novos regatos
buscarão saída imediatamente e, ao não encontrarem um leito
social-democrata, procurarão outros leitos.
A preocupação de Lênin com a
participação do Partido Operário Social-Democrata da Rússia na revolução
de 1905, era a necessidade de ampliar seus militantes em todas as
instâncias partidárias e que a social-democracia não se distanciasse do
movimento de massas, que desse resposta e conduzisse na ação
revolucionária, sendo que aquele momento histórico determinava as ações
militares como o melhor método de instruir a militância, a classe
operária e as massas trabalhadoras. Já nos momentos de repressão e
contra-revolucionários, o estudo sistemático é que passa a ter
importância ímpar, como justifica em seu artigo "A caminho", publicado
no Sotsial-Demokrat, nº 2, escrito em 1909, quando analisava o quadro
político pós-revolucionário e a crise pela qual o POSDR passava.
Indicava, por fim, qual o caminho que a social-democracia russa deveria
seguir. Nesse mesmo artigo, chama a atenção do partido para a
necessidade de uma estreita relação entre a organização partidária e a
educação de seus quadros e militantes, relação que, necessariamente,
deve ser mantida também na ação do partido frente às massas:
... o trabalho
prolongado de educação e organização das massas do proletariado passa ao
primeiro plano; a conbinação da organização clandestina e da legal
impõem ao Partido deveres especiais; a popularização e o esclarecimento
da experiência da revolução, desacreditada pelos liberais e intelectuais
liquidacionistas, são necessários com objetivos teóricos e práticos.
O trabalho de formação do partido se dá
na relação do trabalho de educação e organização em sua estrutura
interna. Isso impõe ao partido a tarefa de organizar e educar a classe
operária e as massas, sendo esta relação que possibilita a educação
política interna e externamente ao partido. Em seu artigo "Tarefas
urgentes de nosso movimento", escrito em Novembro de 1900, indica as
tarefas que o partido é chamado a cumprir:
... dever a que está
chamada a cumprir a social-democracia russa: levar as idéias
socialistas e a consciência política à massa do proletariado e organizar
um partido revolucionário ligado indissoluvelmente ao movimento
operário espontâneo.
Segundo os princípios
marxista-leninistas, a revolução socialista é um processo que compreende
a articulação do Partido revolucionário com a ação revolucionária das
massas, portanto, o partido tem que, necessariamente, estar junto do
povo para que possa cumprir seu papel político, pedagógico e
organizador, para dirigir e elevar a consciência política do
proletariado e das massas para a revolução.
A atuação do partido junto à classe
operária e às massas não se limita aos movimentos espontâneos, mas
também às instituições em que essas camadas da sociedade se organizam.
Lênin, em seus escritos, privilegia a atuação do Partido Comunista nas
organizações sindicais, ressaltando que os comunistas devem atuar em
todos os sindicatos, principalmente nos reacionários, pois é neles que
se encontram a massa mais atrasada do proletariado e do campesinato e
também, que é papel do partido elevar a consciência política destas
massas.
... o papel de
vanguarda do proletariado, que consiste em instruir, ilustrar, educar,
atrair para uma vida nova as camadas e as massas mais atrasadas da
classe operária e do campesinato.
Quanto à participação nas instituições
legais, justifica, em vários textos, a participação do Partido
Social-Democrata no Parlamento Burguês. Diz ele no artigo "Qual a
atitude dos partidos burgueses e do partido operário ante as eleições à
Duma?", publicado em 31 de Dezembro de 1906, no semanário Ternii Trudá,
nº 2:
O que nos importa
não é assegurar por meio de negociatas um lugar na Duma. Ao contrário,
estes lugares somente são importantes na medida em que possam contribuir
para desenvolver a consciência das massas, elevar seu nível político,
organizá-las, não em nome da placidez filistéia, da 'tranqüilidade', da
'ordem' e da prosperidade pacífica (burguês)", mas em nome da luta, da
luta para conquistar a plena libertação do trabalho de toda exploração e
opressão.
Também em seu artigo "A caminho", indica
qual deve ser a atuação dos comunistas em decorrência da derrota do
movimento revolucionário de 1905/1907, e como deveriam atuar nas
condições que aquele momento lhes impunha:
Esta etapa deve ser
superada; as novas condições do momento reclamam novas formas de luta; a
utilização da tribuna da Duma é uma necessidade absoluta; o trabalho
prolongado de educação e organização das massas do proletariado passa ao
primeiro plano.
O marxismo-leninismo apresenta
princípios na defesa do trabalho de formação política da classe operária
e das massas. Quanto aos meios se diferenciam segundo as condições
políticas que se apresentam a cada momento histórico, mas os objetivos
permanecem os mesmos, ou seja, educar e formar a classe operária e as
massas para a revolução e construção do socialismo.
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